Ciclistas a par

A propósito de notícias vindas a público esta semana, veiculadas pela Lusa, a MUBi gostaria de esclarecer:

i) Não há razões consistentes para exigir a obrigatoriedade de matrícula para bicicletas, licença de condução e seguro para ciclistas.

Antes de mais, convém referir que mais nenhum país europeu tem estas obrigatoriedades, nem as está a debater neste momento. Esta realidade, por si só, apesar de não nos dar ou tirar a razão, alerta-nos para o facto de, ao defender estas medidas, muito provavelmente, estaremos a olhar para o problema de uma perspetiva errada.

A razão fundamental por que nenhuma destas obrigações faz sentido, e por que nenhum país europeu as considera, é que a bicicleta tem níveis de perigosidade baixos (contrariamente aos veículos motorizados) e, na generalidade dos casos, apenas causa danos de valor muito reduzido, em caso de sinistro. Para além disso, a promoção do uso da bicicleta induz um ambiente rodoviário mais seguro e apresenta enormes vantagens para a sociedade, pelo que a barreira à sua utilização introduzida por qualquer destas medidas seria negativa para a segurança, economia, ambiente, equidade social do país, contrariando todas as políticas de promoção de modos de vida ativos, que constituem um dos principais desafios de Portugal e da União Europeia para as próximas décadas.

ii) Relativamente à questão do pagamento dos danos ocorridos num sinistro entre veículos motorizados e utentes vulneráveis, a MUBi defende a introdução do Princípio da Responsabilidade Objetiva (conhecida em muitos países da Europa por vários nomes, por exemplo Loi de Badinter, Strict Liability, Betriebsgefahr) de forma clara e explícita, na legislação portuguesa. Este conceito está na base da Diretiva 2009/103/CE do Parlamento Europeu e do Conselho: “Os danos pessoais e materiais sofridos por peões, ciclistas e outros utilizadores não motorizados das estradas, que constituem habitualmente a parte mais vulnerável num acidente, deverão ser cobertos pelo seguro obrigatório do veículo envolvido no acidente caso tenham direito a indemnização de acordo com o direito civil nacional.”

O Princípio da Responsabilidade Objetiva é um instrumento jurídico muito utilizado em diversas áreas que permite autonomizar, em maior ou menor grau, a compensação dos danos da determinação da culpa.

Quando aplicado a sinistros rodoviários que envolvam um veículo motorizado e um utilizador vulnerável (peão ou ciclista), o Princípio da Responsabilidade Objetiva defende que o seguro do condutor motorizado deve compensar os danos à vítima de forma imediata. Posteriormente, se for provado que o utente vulnerável foi culpado pela colisão, a seguradora terá sempre a possibilidade de reaver o montante indemnizatório, ou parte dele, dependendo do tipo de vítima e das circunstâncias da colisão.

A aplicação do Princípio da Responsabilidade Objetiva tem pelo menos dois benefícios importantes:

  1. Garante a indemnização imediata das vítimas;
  2. Promove uma cultura de segurança no meio rodoviário, indo ao encontro da aplicação prática do princípio de especial cuidado perante os utentes vulneráveis, presente na nova versão do Código da Estrada.

De referir que a generalidade dos países europeus que adoptaram o Principio da Responsabilidade Objetiva registam actualmente índices de sinistralidade inferiores aos de Portugal, beneficiando com essa medida tanto os condutores automobilizados como os utentes mais vulneráveis. Em Portugal, a redução na sinistralidade rodoviária resultante da adoção deste principio deverá, igualmente, ser indutora de uma redução nos valores das apólices de seguros dos veículos motorizados.

Assim, ao contrário do que tem vindo a ser divulgado na comunicação social com meias verdades suportadas em citações parciais e descontextualizadas, a MUBi não defende qualquer agravamento dos seguros automóveis nem que estes tenham que compensar sempre e de forma definitiva as vítimas. Pelo contrário, caso estas venham a ser responsabilizadas pelo sinistro, cabe à seguradora o direito de vir a ser ressarcida de parte da compensação prestada ao utente vulnerável, em tribunal.

A MUBi considera que o Princípio da Responsabilidade Objetiva é uma peça fundamental na construção de um meio rodoviário seguro para todos os tipos de utentes, dado que é um garante da indemnização imediata das vítimas e contribui para o desenvolvimento de uma cultura de responsabilização proporcional ao perigo potencial das diferentes formas de deslocação.

6 Responses to Seguros e utentes vulneráveis: o que defende realmente a MUBi?

  1. Manuel Mogo diz:

    Eu sou ciclista há muitos anos e a minha opinião é a seguinte.

    Automobilistas, peões e ciclistas não são classes estanques em que cada um ocupa o seu espaço, somos todos nós e necessitamos de regras para uma sã convivência no espaço público que utilizamos, a estrada. Em caso de acidente entre automobilistas e peões/ciclistas estes últimos são, efetivamente, o elo mais fraco.

    Tomando isto como ponto de partida, importa clarificar duas situações muito importantes;

    1. O peão ou ciclista, justamente por serem o elo mais fraco, devem rodear-se de todos os cuidados (os que estão na lei e os que não estão, mas que o bom senso aconselha, para se proteger.
    2. O peão ou ciclista, pode ter razão quando sofre um acidente e ser ressarcido financeiramente pelos danos sofridos. Todavia, nada, mesmo nada, pode minorar o seu sofrimento e dor.

    Ora o que eu vejo nos meus congéneres ciclistas, na cidade e na estrada é que descuram a sua proteção. Ignoram sinais vermelhos, ignoram a prioridade, circulam em contramão, sem luzes e refletores, por cima dos passeios (os peões pelos vistos pela perspetiva do ciclista não tem direitos), vestem-se maioritariamente de negro e até as Associações que os defendem, põem em causa que o uso do capacete seja útil como forma de proteção. Ainda que seja elementar não fazer nada disto, acresce o facto de, caso não tenham dado por isso, a maioria destas situações são proibidas pelo Código da Estrada.

    Para manter a tal sã convivência na estrada, os ciclistas viram aprovado um novo Código da Estrada “O desejado” destinado a dar-lhes mais proteção. Estranhamente são os próprios ciclistas a desrespeitá-lo ostensivamente. Nasceu uma classe de utentes da estrada (ecológicos como convém) que passaram a fazer da via pública uma coutada para as suas duas rodas. Uma boa parte destes ciclistas investe em máquinas e acessórios valores que chegam facilmente aos 2 mil euros ou mais e são estes amigos que não compram uns refletores ou luzes ou queixam-se do preço de um seguro. E não o fazem por falta de dinheiro, mas apenas porque ou são fundamentalistas no que toca ao peso das suas bikes e por isso aquelas gramas a mais afeta-lhes o ritmo de treino ou acham que os refletores ou as luzes (obrigatórias pelo Código da Estrada) estraga-lhes o visual das máquinas.

    Recusam-se a pagar um seguro porque é caro (as Associações que os defendem apoiam-nos). O que farão quando, por exemplo, circulam em cima do passeio ou passam um sinal vermelho, atropelarem um idoso ou um profissional liberal que fiquem impedidos, no primeiro caso de continuar a fazer a sua vida normal, ou no segundo caso, impedido durante um período de tempo de trabalhar. Quem paga? Em suma, os ciclistas estão convencidos que o novo CE delegou nos automobilistas a responsabilidade de os proteger e que os órgãos de comunicação social estão obrigados a publicar tudo o que entendem, ao abrigo do Direito de Resposta, ou seja a lei que, quando não lhes convém, ignoram. Só falta manifestarem-se contra o seguro com o slogan “Não Pagamos!”

    Não sei se se discute ou não noutros países a obrigatoriedade de ter seguro, mas sei, seguramente que é mais seguro tê-lo. O seu custo pode ser um sacrifício financeiro para quem tem pouco mas não o é para a maioria dos ciclistas.

    Sobre esta casta de ciclistas e respetivo associativismo, estamos conversados.

    O que sucede quando estes peões e ciclistas passam a pilotar o seu carro? Não sei nem quero saber, mas espero que a Polícia e a GNR os sancione duramente como automobilistas, mas também como peões e ciclistas quando, gratuitamente, ignoram o Código da Estrada. O que eu não posso admitir é como automobilista, ser responsável por mim nesta qualidade e por mim na qualidade de ciclista e peão. Caso contrário, não sou gente, sou inconveniente, presumido, e pedante.

  2. Sérgio diz:

    Totalmente contra.

    Já que falam tanto de artigos e de lei procurem os que falam sobre o direito à propriedade e à sua conservação.

    Pode ser que percebam que o que dizem é ilegal.

  3. Ainda sobre o direito de resposta! Dita o n.º 1 do artigo 24.º da Lei da Imprensa. “Tem direito de resposta nas publicações periódicas qualquer pessoa singular ou coletiva, organização, serviço ou organismo público, bem como o titular de qualquer órgão ou responsável por estabelecimento público, que tiver sido objecto de referências, ainda que indiretas, que possam afectar a sua reputação e boa fama.” Não percam tempo, têm 30 dias para usá-lo, ou seja até dia 28 de agosto!

  4. Excelente! Faço um repto à MUBi que difunda este texto pelos jornais, invocando o direito de resposta, sendo que neste caso, os periódicos à Luz da lei da Imprensa ficam obrigados a publicar este texto!
    Mais concretamente art.ºs 24º e 25º da Lei de Imprensa, aprovada pela Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro, com as alterações introduzidas pala Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho. Não se acanhem, usem dos vossos direitos!

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