Partidos e deputados representando 93% dos assentos parlamentares apresentaram propostas de recomendação ao Governo de apoio e estímulo aos modos activos de deslocação no pós-confinamento da pandemia da COVID-19.

UPDATE (26/06/2020):

Os seis projectos de resolução viriam a ser aprovados na reunião de 17 de Junho da Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território.
Um resumo escrito, que vale a pena ler, das apresentações e discussão destes projectos está disponível aqui. O registo audio da reunião completa, aqui (com a parte respeitante a estes seis projectos, entre 10:30 – 01:09:20).

Os projectos viriam, a seguir, a ser votados na Reunião Plenária de 19 de Junho, tendo quatro sido aprovados e dois rejeitados, conforme indicado na seguinte tabela:

Os quatro projectos aprovados em Plenário voltaram a baixar à Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território. Na reunião de 24 de Junho, a Comissão tentou chegar a acordo para a redacção de um texto único/comum, mas não existiu consenso entre os partidos responsáveis pelos projectos. Audio desta reunião disponível aqui.

Os quatro projectos estão agendados para a reunião de 1 de Julho, onde aparentemente se procurará chegar a um texto comum com os projectos do PAN, PEV e PSD e um outro texto com o projecto do PS.

Depois de adiada a discussão, inicialmente agendada para 3 de Junho, estarão esta quarta feira, 17 de Junho, em debate na Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, na Assembleia da República, seis projectos de resolução que instam o Governo a apoiar os modos activos de deslocação no pós confinamento da pandemia de COVID-19.

Estas seis propostas de recomendação ao Governo – iniciativas do Bloco de Esquerda, do PAN, do Partido Ecologista “Os Verdes”, da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, do Partido Social Democrata e do Partido Socialista, que constituem em conjunto 93% dos assentos na Assembleia da República – estão apresentadas mais abaixo. Algumas delas invocam as propostas e recomendações que, ao longo destes últimos meses, a MUBi tem apresentado junto das administrações central e locais.

Como tem sido amplamente noticiado pelos meios de comunicação, Governos em todo o mundo estão a adoptar políticas públicas sem precedentes. São medidas que visam, sem ambiguidades,
conter o regresso ao uso massivo do automóvel e poluição resultante, ajudar a aliviar a pressão sobre os transportes públicos e contribuir para a redução do risco do contágio e para a saúde pública da população. Com esse propósito, países como França, Itália e o Reino Unido lançaram já programas de emergência de centenas de milhões de Euros de apoio e estímulo à mobilidade activa, e em particular à utilização da bicicleta.

Mas estes incentivos por parte dos governos não surtirão efeito sem profundas alterações do espaço público. Inúmeras cidades em todo o mundo estão a transformar as suas ruas nas últimas semanas, a criar “corredores de saúde” que alarguem os passeios e permitam o distanciamento físico dos peões e que garantam o uso da bicicleta em segurança nas ruas principais, a fechar ruas ao trânsito automóvel, a baixar limites de velocidade.

Lisboa e Porto já anunciaram medidas, relativamente modestas quando comparadas com o outras cidades europeias já apresentaram. Urge que o Estado Central assuma as suas responsabilidades e estabeleça um plano de emergência de estímulo à mobilidade activa e de apoio, financeiro e operacional, aos municípios portugueses, em resposta à pandemia de COVID-19.

A MUBi apresentou ao Governo, no passado dia 5 de Junho, a proposta de um programa de emergência de 50 milhões de Euros de apoio e estímulo aos modos activos de deslocação no pós confinamento da COVID-19, a ser inscrito no Orçamento do Estado Suplementar. O OE Suplementar está em discussão na Assembleia de República até 3 de Julho.

No questionário que a MUBi realizou aos candidatos a Deputado na Assembleia da República, nas Eleições Legislativas do ano passado, de entre as centenas de participantes – de partidos que hoje ocupam 227 dos 230 lugares no Parlamento -, a vasta maioria manifestou-se a favor de medidas de incentivo à mobilidade activa e mais sustentável e da redução da utilização do automóvel em Portugal. Se a sua importância e prioridade era quase consensual antes da pandemia, é, agora, uma emergência.


Projectos de Resolução

O Projecto de Resolução 439/XIV – “Incentivo aos modos ativos de transporte durante e após o período de pandemia para a proteção do ambiente e do espaço público“, do Bloco de Esquerda (BE), faz referência às propostas que a MUBi, no passado 23 de Abril, apresentou ao Governo para a saída e pós-confinamento da COVID-19, e propõe ao Governo que:

1 – Em articulação com as autarquias locais, crie um plano de ação de medidas rápidas, seguras e de custo reduzido que incentivem os modos ativos de transporte, que inclua:
a) a criação de ciclovias temporárias e seguras, nos principais eixos de deslocação dos municípios, designadamente entre zonas residenciais e de trabalho, escolas e universidades;
b) a instalação de estacionamentos de bicicleta, tipo Sheffield, nas zonas de maior afluência e, sempre que possível, em substituição de lugares de estacionamento automóvel;
c) o alargamento e a desobstrução de passeios;
d) o encerramento de ruas à circulação automóvel;
e) a pedonalização de ruas;
f) a supressão de vias de trânsito automóvel;
g) a diminuição dos tempos de espera em zonas de atravessamento de peões semaforizadas, de modo a evitar a concentração de peões;
h) medidas adicionais de proteção dos utilizadores mais vulneráveis da via, nomeadamente peões e ciclistas, através do planeamento e desenho adequado das vias e do espaço urbano, da sinalização e de informação aos utilizadores.

2 – Garanta a concretização do disposto no artigo 284.º do Orçamento do Estado para 2020, relativo ao plano para a intermodalidade da bicicleta nos transportes públicos.

3 – Reforce a intermodalidade e o acesso de bicicletas ao transporte público ferroviário, fluvial e rodoviário.

4 – Encontro formas de retomar o transporte de bicicletas nos comboios com medidas que garantam a segurança sanitária.

5 – Promova a acalmia do tráfego automóvel em zonas urbanas sensíveis, através da limitação da velocidade máxima a 30 km/h.

6 – Determine a gratuitidade dos sistemas públicos de bicicletas partilhadas.

7 – Incentive o uso de bicicletas de carga nos sistemas de logística urbana.

8 – Crie um programa de incentivos financeiros às deslocações pendulares em bicicleta;

9 – Promova uma campanha de âmbito nacional – com o contributo das autoridades de saúde pública – para incentivar os modos ativos de transporte (bicicleta e caminhar) durante e após o levantamento de restrições à mobilidade no âmbito da COVID-19.

10 – Antecipe as metas definidas na Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030, tal como as medidas para as alcançar.

11 – Crie um plano de financiamento adequado às autarquias locais, e em articulação com estas, para a implementação das medidas de incentivo aos modos ativos de transporte aqui preconizadas.

O Projecto de Resolução 448/XIV – “Recomenda ao Governo que promova os meios activos de transporte, durante e após a crise da Covid-19“, do PAN, que, tal como o do BE, invoca também as propostas da MUBi ao Governo para a saída e pós confinamento, recomenda ao Governo que:

1. Concretize e calendarize as medidas, no âmbito da Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030, até ao final de 2020.

2. Acelere a prossecução dos objectivos fixados para 2025 e para 2030 na Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030.

3. Crie um grupo de trabalho, para a elaboração de um guia de recomendações e orientações, dirigidas às administrações locais, com a salvaguarda do financiamento de medidas a implementar.

4. Crie ciclovias temporárias, com prioridade aos principais eixos de deslocações.

5. Instale parqueamentos seguros para bicicletas, em particular em edifícios e serviços do Estado, centros urbanos e outros locais de afluência de pessoas, sem prejudicar os espaços pedonais e inclua esta acção nas medidas da Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030.

6. Estabeleça planos de urgência de estímulo à mobilidade em bicicleta e inclua estes planos nas medidas da Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030.

7. Identifique as zonas urbanas sensíveis a incidentes com bicicletas e promova a redução da velocidade máxima de circulação nessas zonas e inclua esta acção nas medidas da Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030.

O Projeto de Resolução 452/XIV – “Garantia de aumento da oferta de transportes públicos, em época de desconfinamento, e aceleração da concretização da estratégia nacional para a utilização da bicicleta“, do Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV), para a mobilidade em bicicleta propõe ao Governo que:

3. Priorize, em consonância com os municípios, a implementação da estratégia nacional para a mobilidade ativa ciclável 2020-2030, de modo a acelerar a sua concretização e a incentivar os cidadãos para a utilização da bicicleta como modo alternativo de transporte.

4. Articule com os municípios a dimensão intermunicipal das redes de pistas cicláveis e assegure o estacionamento para modos suaves ou ativos de mobilidade junto a todos os serviços públicos com atendimento aos cidadãos.

O Projecto de Resolução 476/XIV – “Recomenda ao Governo o aumento da oferta de transportes públicos e implementação de Plano Urgente de Estímulo à Mobilidade Ativa“, da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, faz, igualmente, referência às propostas da MUBi, e no âmbito da mobilidade em bicicleta recomenda ao Governo que:

4 – Reforce a intermodalidade através do acesso gratuito de bicicletas ao transporte público fluvial, ferroviário e rodoviário;

5 – Implemente, em colaboração com as autarquias, um Plano Urgente de Estímulo à Mobilidade Ativa, que estimule a micromobilidade e inclua:
a) disponibilização gratuita de bicicletas;
b) criação de ciclovias temporárias com perspetiva de passarem a permanentes;
c) encerramento de ruas à circulação automóvel e alargamento e desobstrução de passeios (corredores de saúde);
d) instalação de parqueamento adequado para velocípedes (Modelo Sheffield);
e) redução de velocidades máximas de 20-30 km/h em zonas de coexistência;
f) fiscalização de comportamentos de risco na condução de veículos motorizados.

6 – Crie e implemente um programa de incentivos financeiros e/ou fiscais às deslocações pendulares em bicicleta (“bike-to-work”), tais como remuneração por quilómetro percorrido em bicicleta nesse trajeto e possibilidade de desconto da compra no IRS;

7 – Antecipe a implementação da Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030.

O Projeto de Resolução 499/XIV – “Recomenda ao Governo o incentivo ao planeamento da mobilidade e urbanismo, durante e no pós-Covid, para a resiliência das vilas e cidades portuguesas“, do Partido Social Democrata (PSD), deu entrada no passada sexta feira, 29 de Maio, e com potencial impacto para a mobilidade activa propõe ao Governo que:

1. Promova, em estreita articulação com os diversos intervenientes, a adoção de medidas de emergência, concedendo as condições técnicas e financeiras necessárias para as autarquias elaborarem o Plano de Medidas Ágeis de Mobilidade e Urbanismo Covid-19, de custos reduzidos, que incentivem a utilização dos modos sustentáveis de deslocação, privilegiando a aposta efetiva nos modos suaves e ativos, e a criação de percursos pedonais seguros, acessíveis e confortáveis e recorrendo a métodos seguros, ágeis, económicos e temporários de sinalização;

2. Desenvolva efetivamente medidas de maior articulação e intermodalidade dos diversos modos de transporte nos “nós” de mobilidade, nomeadamente as interfaces nos seus diferentes níveis hierárquicos, e o aumento da possibilidade de transporte de bicicletas ou outros velocípedes no transporte público rodoviário, ferroviário e fluvial;

3. Reforce e motive a continuidade das boas práticas de logística urbana adquiridas no período Covid-19, [….] essencialmente recorrendo-se a veículos mais amigos do ambiente e com claros benefícios para a saúde pública;

4. Promova, em estreita articulação com os diversos intervenientes dos diversos níveis de governação, a adoção de medidas de curto e médio prazo, que possibilitem: […] garantir um melhor planeamento da mobilidade nos grandes polos geradores de deslocações e do transporte de funcionários por forma a minimizar as necessidades de deslocação em automóvel; promover um melhor ordenamento do território e urbanístico; […] promover […] um desenho de cidade mais atento à qualidade de vida das pessoas, ao impacto causado no ambiente e à eficiência de recursos; e promover uma adequação e ampliação do Código da Estrada, onde se destaque a via pública não somente enquanto espaço dedicado à função de tráfego e circulação mas antes um espaço de fruição e convivência.

5. Por último, após a implementação das medidas ágeis em enquadramento de emergência, urge a necessidade de proceder à sua monitorização e avaliação, adicionando-se as medidas de curto e médio prazo anteriormente referidas, integrando-as num único documento estratégico.

Uma outra proposta, o Projecto de Resolução 505/XIV – “Recomenda ao Governo que reforce os incentivos do Estado ao uso das bicicletas“, do Partido Socialista, cuja discussão, tanto quanto conseguimos saber, não está ainda agendada, recomenda ao Governo que:

1. Acelere a execução da Estratégia Nacional de Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030;

2. Pondere comparticipar a construção de sistemas de parqueamento e de apoio ao modo ciclável nas interfaces de transportes, promovendo a intermodalidade com comboio, barco, metro e autocarro;

3. Avaliar, de acordo com o método definido no grupo de trabalho para o estudo dos benefícios fiscais, a introdução de incentivos fiscais, em sede de IRS e IRC, à utilização da bicicleta, nomeadamente no momento da aquisição e da reparação e sempre que seja utilizada para deslocações entre casa e trabalho e tendo em conta os objetivos de mobilidade sustentável;

4. Avalie a viabilidade de promoção de um programa de incentivo à utilização de bicicletas na Administração Pública;

5. Pondere comparticipar a implementação de Planos de Ação Rápida para a Mobilidade Suave ou Ativa, com medidas de custo reduzido, para conferir espaço e segurança aos utilizadores vulneráveis do espaço público, incentivando os modos suaves ou ativos ao nível municipal;

6. Considere apoiar a criação de planos de mobilidade sustentável por parte de grandes polos atractores ou geradores de deslocações (equipamentos de serviços públicos, grandes empresas, por exemplo) e alinhar incentivos com as medidas propostas, considerando as empresas que adotem planos de mobilidade sustentável, bem como os profissionais que utilizem bicicleta;

7. Ponderar a definição e desenvolvimento de uma Rede Nacional de Infraestruturas Cicláveis, incluindo a definição de infraestruturas de âmbito internacional, nacional, regional/intermunicipal e local, promotora da mobilidade suave contínua, conexa, segura e inclusiva;

8. Pondere e avalie o aumento da comparticipação e do número de aquisições de bicicletas convencionais ou com assistência elétrica no âmbito dos avisos do Fundo Ambiental.

Uma outra iniciativa parlamentar esteve já em discussão na Assembleia da República: o Projeto de Resolução 444/XIV – “Recomenda ao Governo que efetue uma transição económica e social sustentável no decurso da crise da Covid-19“, do PAN. Esta iniciativa, com uma abrangência ambiental mais ampla, na área da mobilidade recomendava ao Governo que:

2. Aposte no teletrabalho e na mobilidade sustentável, com melhoria da rede de transportes públicos em quantidade e qualidade, na ferrovia e no apoio ao desenvolvimento de tecnologias mais limpas como a mobilidade eléctrica e combustíveis neutros em carbono como o bio CCS (Carbon Capture and Storage),e, também, acelere a implementação da Estratégia Nacional para a Mobilidade Activa Ciclável 2020-2030.

Este projecto de resolução de recomendação ao Governo foi rejeitado na Reunião Plenária do passado 28 de Maio, com:

  • os votos favoráveis do BE, PAN e da Deputada Joacine Katar Moreira,
  • as abstenções do PSD, PEV e Iniciativa Liberal
  • e os votos contra do PS, PCP, CDS-PP e Chega.

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