Uma das medidas mais importantes para tornar as zonas urbanas mais seguras e com maior qualidade de vida para os seus habitantes, é implementar medidas físicas que forcem as velocidades dos veículos motorizados a serem moderadas, de preferência até 30km/h, nas ruas em que o volume e a velocidade do trânsito motorizado o justifique. Tal permite diminuir drasticamente o nível de ruído nas zonas residenciais e aumentar significativamente a segurança, em zonas onde frequentemente brincam crianças, circulam muitos peões e utilizadores de bicicleta e vagueiam mesmo animais domésticos. Medidas físicas de acalmia de tráfego, quando eficientemente implementadas, também promovem o florescimento do comércio local, incrementando ainda a coesão da comunidade.

É essencial então compreender que medidas físicas de acalmia de tráfego providenciam maior sossego nos bairros, com a redução da poluição sonora, redução da poluição atmosférica e não menos importante, maior segurança para todos os habitantes, crianças e idosos principalmente. A questão da segurança urbana dos peões é também deveras relevante pois a energia cinética do veículo, fator importante na gravidade dos atropelamentos, é proporcional ao quadrado da velocidade. Significa isto que um atropelamento a 50km/h não implica estatisticamente o dobro da severidade em comparação com um atropelamento a 25km/h, mas o quádruplo, visto que a relação entre energia e velocidade é quadrática e não linear.

image05 De referir ainda que o número de atropelamentos tem vindo a aumentar e cerca de 80% registam-se em zonas urbanas. Em 2013 ocorreram mais de 5,000 atropelamentos em Portugal (mais 6% que no ano transato). Estes números são inaceitáveis. O excesso de velocidade dos veículos automóveis é um factor presente na quase totalidade dos atropelamentos. Em Portugal as medidas físicas para a redução da velocidade resumem-se, na grande maioria dos casos, às denominadas “lombas”, sendo por vezes meras peças de borracha aparafusadas ao pavimento.

Estas medidas adotadas amiúde em Portugal não são as melhores opções por diversos motivos. Para além de serem especialmente penalizadoras para ciclistas ou motociclistas e também para os transportes coletivos de passageiros e veículos de emergência, não trazem grandes vantagens ao atravessamento dos peões.

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Lombas (com perfil semi-cilíndrico) a evitar.

No entanto a “lomba” é ainda a forma mais simples e económica de acalmia de tráfego na via. Como se vê por tantos bairros pela Europa, é recomendável que tenha um desenho cuidado de forma a de facto reduzir velocidades, sem ser demasiado agressiva para automóveis e veículos de duas rodas. Esta estrutura por vezes é mais alta, é mais suave e mais longa, e é feita do mesmo material do pavimento, embora com cores diferentes. Tal tem uma função psicológica muito importante pois o automobilista não a encara como uma barreira exterior colocada “para importunar”. Encara-a como algo natural pertencente à via.

Além disso este tipo de soluções não prejudica a suspensão do automóvel e força mesmo o automobilista a abrandar (se acelerar demais o carro toma uma trajetória que por certo danificará mesmo severamente o veículo). Além disso não são um problema para os outros veículos, como bicicletas ou motociclos por exemplo, mas também são incomodativas para pessoas que se deslocam de cadeira de rodas. Os exemplos das fotos seguintes estão perfeitamente integrados no desenho da via, são mais confortáveis e no entanto mais eficazes.

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image15Estreitamento com “lomba” combinados dois efeitos de acalmia de tráfego.

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Este exemplo na foto de cima de um bairro residencial na Holanda ilustra uma “lomba” em calote esférica. Trata-se de um círculo com relevo, normalmente colocado em zonas de interseção, em que a cota do ponto central força os automóveis a abrandar. No entanto a distância da extremidade do círculo (ponto da circunferência) ao ponto central é tal, que torna a passagem muito suave para a suspensão dos veículos.

Algo que também é raro ver-se em Portugal mas comum pela Europa, é colocar toda a zona do cruzamento, ou a zona de atravessamento de peões exatamente à mesma cota e revestida do mesmo pavimento do passeio ou da zona pedonal. Tal tem uma função psicológica muito importante, pois o automobilista tem a sensação de estar em espaço alheio, espaço não seu por natureza, e por tal facto tem maior zelo perante a segurança do peão.

Como exemplo antagónico, podemos observar o caso da Rua Augusta em Lisboa na próxima foto, onde os peões, numa das poucas ruas pedonais com uma largura considerável e numa das artérias de Lisboa com maior fluxo de tráfego pedonal, veem o seu espaço interrompido pela circulação automóvel que faz o atravessamento das artérias perpendiculares como a Rua da Conceição, tendo os peões que atravessar uma via alcatroada e preparada unicamente para tráfego rodoviário. Para além disso a maioria do tempo dos semáforos é atribuída ao tráfego motorizado.

Na foto seguinte dezenas de pessoas devem esperar em pé na via pedonal, para que duas ou três pessoas passem na via rodoviária transversal.

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Já estes outros exemplos nas fotos seguintes, e muito comuns pela Europa nas zonas residenciais e zonas pedonais, adotam o princípio inverso, dando a prioridade nas zonas de interseção aos peões, sem que haja qualquer semaforização.

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Este exemplo é claramente mais adequado. Um invisual sente que está num atravessamento, pois existe diferenciação de material. O nível do atravessamento é o do passeio, o que induz redução de velocidade no automóvel e torna o peão mais visível.

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Nesta foto acima toda a zona do cruzamento está à cota do passeio. É perfeitamente legal neste caso fazer o atravessamento desta zona na diagonal, ou seja, se tomarmos uma abordagem geométrica e considerarmos que se trata de um quadrado, fazer de um canto ao outro canto oposto ao longo da diagonal do quadrado é perfeitamente legal; algo não fazível legalmente em qualquer lado em Portugal que se tenha conhecimento. Em Portugal ter-se-á que percorrer as arestas do quadrado, fazendo-se em média, de acordo com o teorema de Pitágoras, um percurso cerca de 40% mais longo.

image10 Um bom exemplo, Rua do Charquinho, Lisboa

3 Responses to Das medidas físicas de acalmia de tráfego

  1. Andreia Cópio diz:

    Olá, boa noite,

    O artigo está muito bom, claro e bem estruturado.

    Gostaria de saber onde fica a “lomba” em calote esférica, pode me dizer em que bairro residencial é que fica na Holanda (pin do google earth ou coordenadas)?

    Obrigada

    Obrigada

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