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Foto: Paulo Natividade.

A MUBi enviou ao Presidente da Câmara Municipal do Porto Rui Moreira e à Vereadora da Mobilidade Cristina Pimentel, a seguinte carta:

 

ASSUNTO: Ponto da situação das políticas de mobilidade em modos ativos (em particular em bicicleta)

 

Exm.º Sr.º Presidente, Exm.ª Sr.ª Vereadora da Mobilidade, Exm.º Sr.º Vereador do Urbanismo da Câmara Municipal do Porto,

A cidade do Porto tem vindo a assistir, nas últimas décadas, a um aumento significativo da utilização do transporte privado pessoal motorizado. Este fenómeno, facilmente comprovável por quaisquer dados estatísticos, e mesmo pelo senso comum, tem provocado uma pressão na utilização do espaço público rodoviário, tem aumentado a poluição (CO2, micropartículas, metais pesados, poluição sonora, etc.) e tem reduzido a qualidade de vida dos munícipes e de quem se desloca pendularmente para a cidade.

A estratégia da União Europeia e o objetivo da redução das emissões de gases de efeito de estufa situa-se em pelo menos 20% até 2020 (face a valores de 1990) e a estratégia adotada por diversas cidades europeias na redução do monopólio do veículo particular motorizado tem vindo a mostrar resultados interessantes (cf. Bordéus, Paris, Sevilha, Barcelona, por ex.).

A Resolução da Assembleia da República n.º 14/2012 recomenda ao Governo a promoção da mobilidade sustentável com recurso aos modos suaves de transporte, através de medidas efetivas que garantam condições de circulação aos seus utilizadores e a sua segurança, nomeadamente através de:

­ – “salvaguarda da componente de mobilidade sustentável (em especial os modos suaves ­ bicicleta e pedonal) nos instrumentos de ordenamento do território, planeamento urbano e viário em colaboração com as autarquias” e que sejam previstas “soluções facilitadoras do uso de modos suaves” ;

­- promoção de “uma maior adaptação dos edifícios e do espaço público de forma a potenciar a utilização de meios de transporte sustentáveis, nomeadamente da bicicleta”.

Em outubro de 2015, ocorreu a primeira reunião ministerial dos países-membros da União Europeia dedicada exclusivamente à mobilidade em bicicleta. Na Declaração de Luxemburgo, a União Europeia reconhece os benefícios da utilização da bicicleta como modo de transporte. Os ministros e secretários de estado presentes comprometeram-se a promover a mobilidade em bicicleta, como um modo de transporte eficiente e amigo do ambiente, e a privilegiar iniciativas de autoridades urbanas, locais e regionais para incluir a mobilidade em bicicleta nos seus projetos.

Considerando que:

A percentagem média dos recursos financeiros atribuído às deslocações, em Portugal, representa 12,4% do orçamento das famílias, percentagem que se agrava com o fim dos passes sociais para jovens e com as limitações nos horários dos serviços de transportes públicos;

Portugal tem a taxa de motorização absoluta mais alta do mundo, com 778 veículos por cada 1000 habitantes (valores de 2008) e é o terceiro país da União Europeia com mais automóveis ligeiros per capita (EUROSTAT 2011);

Circulam em Portugal cerca de 6 milhões de automóveis, ou dito de outro modo, quase 600 automóveis por cada mil habitantes;

A esmagadora maioria das famílias portuguesas utiliza o automóvel como meio de transporte, apesar de ser a forma mais cara, poluente e a que mais contribui para a insegurança nas cidades, em particular das (poucas) crianças que (ainda) circulam a pé, bem como de adolescentes e idosos;

As deslocações em bicicleta em meios urbanos até 8 km ou 15/20 km (se combinadas em mobilidade multimodal como o metro) são a opção mais prática e económica, bem como, na maioria dos trajetos curtos em contexto urbano, mais rápida;

A velocidade média de um adulto, em bicicleta, é de entre 15 a 22 km/h, não muito distante da velocidade média dos restantes modos de transporte rodoviário urbano;

A deslocação em automóvel provoca maior obesidade, não estimula o desenvolvimento cognitivo nem promove um maior rendimento académico;

Os custos de congestionamento provocados pelo automóvel privado representam cerca de 1% do PIB, na Europa (Christidis, Ibanez Rivas, 2012, Measuring Road Congestion, JRC Technical Notes, IPTS), para além dos investimentos avultados em semaforização, passadeiras com LED intermitentes e sinais luminosos intermitentes;

Vários estudos europeus demonstram que, por quilómetro percorrido, as deslocações feitas em automóvel acarretam custos totais (diretos + externos) para a sociedade várias vezes superiores aos custos também totais das mesmas deslocações feitas em bicicleta, S. Gossling e A. S. Choi (2015)Andy Cope (2016);

colocamos as seguintes questões ao executivo da câmara municipal do Porto:

1 – Está prevista alguma adaptação ou intervenção para a ciclovia da Avenida da Boavista, considerando a perigosidade da solução existente? Para quando? (ver artigo da MUBi)

2 – Quais os prazos previstos para a intervenção e para a reabilitação da ciclovia da marginal a montante da Ponte Luiz I, na zona ribeirinha (Av. de Gustavo Eiffel) uma vez que há um canal para ciclovia que está por acabar?;

3 – Quais os projetos previstos para a ligação entre cotas baixa e alta e em que prazos estão previstos a sua construção e conclusão?

4 – Está pensada alguma negociação com a Infraestruturas de Portugal para a adaptação do antigo canal ferroviário entre o edifício da alfândega do Porto, a zona de Campanhã e a Ponte D.ª Maria?

5 – Está pensada a reativação do elevador da ponte da Arrábida? Para quando?

6 – Sendo a Estrada da Circunvalação (N12) estruturante na distribuição do trânsito e particularmente útil para quem circula de bicicleta no sentido nascente – poente (considerando o declive), está decidida alguma alteração no seu desenho, no sentido de a adaptar a um traçado mais próximo de uma via urbana e não de uma estrada nacional?

7 – O que é que a revisão em curso do PDM do Porto contempla em termos de políticas, planos e de melhorias efetivas de condições para a utilização de modos de transporte ativos (a pé e de bicicleta)?

8 – Tendo sido anunciado, qual o ponto de situação do Plano da Orla Marítima do Porto, promovido pela Águas do Porto? (ver artigo da MUBi)

9 – Existe ou está a ser preparado algum plano ou estratégia municipal para adaptar a cidade à mobilidade ativa (a pé e de bicicleta), em particular à mobilidade em bicicleta?

10 – Que visão de futuro tem a autarquia para os modos de transporte ativos, em especial a bicicleta? Que objetivos existem para as quotas de utilização destes modos nos próximos 5 e 10 anos?

 

Dentro do espírito de boa-fé e sempre no interesse dos habitantes da cidade e de todos os que dela usufruem, a MUBi continua sempre disposta a ser um parceiro ativo e pertinente, no que diz respeito aos objetivos que fundamentam o seu âmbito de atuação.

 

Porto, 24 de março de 2016.

A direção da MUBi.

 

 

Consulte aqui este artigo com a bibliografia, em notas de rodapé (PDF).

 

4 Responses to Que política de mobilidade para os modos ativos na cidade do Porto?

  1. Manuel Barros diz:

    Concordo completamente com o conteúdo da carta.
    Acrescentava um medida, que é a permissão de os ciclistas poderem utilizar o corredor BUS, como acontece na generalidade das cidades na Europa, e que, já é permitido pelo código da estrada.

  2. LUIS B. diz:

    A qualidade de vida e dos serviços do Porto foram reconhecidos internacionalmente com o nível “gold”, segundo a norma ISO 37120 – desenvolvimento sustentável das comunidades, galardão que é atribuído pelo Conselho Mundial de Dados das Cidades (World Council on City Data)… a Invicta torna-se assim na primeira cidade portuguesa a ver distinguidos estes indicadores internacionalmente – [Público online 19 ABR 2016].
    Como neste processo são avaliados 100 parâmetros, incluindo o desempenho ambiental, talvez o galardão funcione como um estímulo para que o Porto melhore ainda mais a sua posição entre as melhores cidades do mundo, nomeadamente tratando com mais cuidado os cidadãos não-automobilizados.

  3. Sem dúvida, João. Mas pior do que ciclovias inúteis, é a sistemática política de discriminação positiva do automóvel. As ciclovias são desnecessárias se o automóvel for domesticado. O que se passa é que tudo é pensado em função dele.

  4. João Santos diz:

    Subscrevo! Talvez seja um pouco extensa, ultrapassando o número de palavras que o funcionário que a leia pode assimilar por minuto, mas a mensagem está toda lá, para quem quiser ler. Realmente, é vergonhoso o “nada” que a CMP tem feito nos últimos anos relativamente à mobilidade de bicicleta. Ciclovias mal feitas, perigosas e com localizações de utilidade muito duvidosa. A única utilidade que têm tido é servir de estacionamento de segunda ou primeira fila para os automóveis.

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