De 24 a 26 de Março decorreu, em Aveiro, o V Encontro Nacional de Grupos Promotores da Mobilidade Urbana em Bicicleta. Cerca de 50 pessoas de diferentes associações e colectivos de todo o país, incluindo da MUBi, encontraram-se para partilhar experiências do trabalho que desenvolvem anualmente e criar sinergias de cooperação, à escala nacional. Durante a iniciativa, com recurso a uma dinâmica de trabalho colaborativa, surgiram 9 ideias de projectos para implementação futura! Esta co-ideação permitiu fortalecer a rede de pessoas que trabalham em prol de cidades vivas, com mais bicicletas, mais saúde e melhor ambiente. A organização do Encontro esteve a cargo da Ciclaveiro.

O que é o ENGPMUB

O papel das organizações envolvidas na promoção, activismo e apoio pela mobilidade urbana em bicicleta em Portugal tem hoje, e cada vez mais importância. Por um lado, dada a crescente utilização desta forma de transporte nas cidades, a atenção que a mobilidade em bicicleta tem vindo a ganhar na nossa sociedade — sendo foco das entidades públicas, — nomeadamente, expressa nos objectivos de convergência nesta década com a quota modal média do resto da Europa, os compromissos nacionais e internacionais de redução de emissões e as oportunidades que directivas e programas europeus têm promovido neste âmbito. 

Por outro lado, porque existem ainda  muitos desafios a superar, tais como os preconceitos sociais ainda existentes e uma cultura de mobilidade assente no automóvel particular, que urge mudar; as condições pouco adequadas e muitas vezes perigosas para a utilização quotidiana da bicicleta; ou a falta de vontade política e a timidez de medidas concretas tomadas aos vários níveis locais e centrais da governação.

Neste contexto decorreu em Aveiro o 5.º Encontro Nacional de Grupos Promotores da Mobilidade Urbana em Bicicleta (ENGPMUB), nos dias 24, 25 e 26 de Março de 2022. A organização esteve a cargo da Ciclaveiro, numa óptica de rotatividade entre grupos na organização periódica destes encontros. A primeira edição foi em 2016, também em Aveiro, por iniciativa e organização da Ciclaveiro; em 2017 passou por Lisboa, no Mercado do Forno do Tijolo, organizado pela MUBi; em 2018 rumou a Guimarães, organizado pela GetGreen; e em 2019 decorreu em Braga, organizado pela Braga Ciclável.

Este ano, o Encontro contou com a participação de cerca de 50 pessoas, de diferentes locais de Portugal — Almada, Aveiro, Braga, Coimbra, Guimarães, Lisboa, Matosinhos, Porto. Foi assim possível que as pessoas se conhecessem  pessoalmente, às organizações e projectos que representam, e ainda trabalharem em conjunto no desenvolvimento de novas ideias a implementar. O ENGPMUB serve exactamente para isto: fortalecer a rede nacional de pessoas que trabalham em prol de Cidades Vivas, onde mais pessoas utilizam a bicicleta como meio de transporte! Foi ainda anunciado pela Ciclaveiro o lançamento da nova plataforma online para o Encontro: https://ena.bike/

Programa do Encontro em Aveiro

O Encontro teve lugar em vários espaços da cidade de Aveiro, com uma sessão de recepção e apresentação dos Grupos Promotores da Mobilidade Urbana em Bicicleta (GPMUB) a marcar o primeiro dia, no Avenida Café Concerto. Nesta sessão, que foi aberta à comunidade, apresentaram-se 13 grupos distintos, sendo que a MUBi foi representada pela Vera Diogo, vogal da Direcção.

No segundo dia, decorreu uma sessão de trabalho, em que cada participante apresentou as suas ideias e preocupações no âmbito da mobilidade, em forma de «desafios». Este processo culminou na criação de 9 Grupos de Trabalho mistos, com pessoas de diferentes organizações e colectivos, nos quais se discutiram, fundiram e criaram 9 ideias distintas e (mais ou menos) concretizáveis. Esta sessão realizou-se segundo uma metodologia de trabalho colaborativo, em modo co-criação, e que foi moderada por João Pedro Rosa e por Joana Ivónia, da Ciclaveiro.

Resultados dos grupos de trabalho 

Apresentamos de seguida os resumos das ideias e projectos facultados por cada grupo de trabalho.

Grupo 1 – Legislação e financiamento
Apresentação de uma proposta de criação de um núcleo nacional de apoio jurídico aos GPMUB. A ideia é que este núcleo preste apoio, quer pro bono, quer gratificado (conforme a complexidade do apoio pretendido) aos GPMUB, e que disponha de uma bolsa multidisciplinar de profissionais (advogados, urbanistas, arquitectos, etc.), especializada na área da mobilidade urbana, com vista ao aconselhamento jurídico. Este apoio poderá consistir na elaboração de contratos, protocolos, preparação de petições, apoio a pronúncias no âmbito das consultas públicas e o apoio ao contencioso, quer nos tribunais administrativos, quer nos tribunais judiciais. Este projecto intitula-se «Trituradora» e os elementos do grupo prevêem que esteja operacional em Março de 2023.

Grupo 2 – Cicloficinas móveis 
O grupo propõe a criação de um kit para pequenas reparações de bicicletas em cada esquina.
Criação de uma rede de apoio a ciclistas de longo curso ou pequenos percursos, com kits de reparação rápida de pequenas avarias na bicicleta. O kit inclui, entre outros, câmaras de ar, caixa de remendos, bomba de ar, multi-ferramenta, um manual breve de reparações faz-tu-mesmo.
A localização dos kits será divulgada numa plataforma digital — website ou app. A utilização deste kit seria gratuita para ciclistas ou para parceiros que os disponibilizem. Deste modo podemos ter ciclistas mais autónomos, parceiros e entidades mais amigos dos ciclistas, e uma rede que os liga, acrescentando valor aos negócios que os apoiam.

Grupo 3 – «Cycle In – All in the inner circle»
A bicicleta como elo comum na concretização da educação para a cidadania para todas as pessoas, através da conquista da mobilidade activa e inclusiva, independentemente da condição física, psíquica, social ou cultural.
Cycle In tem como foco promover o desenvolvimento de valências biopsicossociais em comunidades escolares, particularmente entre crianças e jovens com necessidades de apoio adicionais. Pretende-se actuar em escolas do 1.° e 2.° ciclo, facilitando o contacto entre clubes desportivos, associações e comunidades educativas na promoção da utilização da bicicleta como instrumento de inclusão e mobilidade activa.

Grupo 4 – Cicloficinas e inclusão
Este grupo dedicou-se ao tema das cicloficinas — oficinas de bicicletas comunitárias geridas por  voluntários/as, onde se pode aprender e passar conhecimentos de mecânica de modo a tornar autossuficientes as pessoas que utilizam a bicicleta no dia-a-dia em ambiente urbano.
Os desafios identificados pelo grupo foram:
1. A falta de um espaço de trabalho comum onde guardar peças e ferramentas; 2. A desaceleração do impacto das cicloficinas fixas na sua comunidade; 3. A necessidade de mobilidade para participar em eventos pontuais e em actividades com parceiros, incluindo em eventos que promovem a igualdade de género.
Com o título “Criação de guião para a criação de cicloficinas móveis”,  propõe-se um trabalho colaborativo entre as várias cicloficinas, com o objectivo de desenvolver um guião compreensivo para apoiar cicloficinas já existentes e os novos entusiastas, a criarem cicloficinas de base móvel por todo o país, com planos de acção e parcerias nas suas comunidades.

Grupo 5 – Sustentabilidade organizacional: TRRRIIINDER

Existe uma enorme vontade de desenvolver projectos em prol da mobilidade activa, mas falta capacidade para os desenvolver, com a dimensão e impacto necessários, por parte de grupos e organizações com escala reduzida e com recursos e conhecimentos limitados.

O Trrriiinder pretende melhorar a eficiência e eficácia dos investimentos e projectos das organizações promotoras da mobilidade em bicicleta. O Trrriiinder consistirá numa plataforma de matchmaking de competências, recursos e colaboração para projectos entre organizações e pessoas que pretendam realizar projectos no domínio da mobilidade activa. As funcionalidades desta plataforma irão partilhar informação relevante, com vista a estabelecer uma ponte para ligações úteis entre organizações, pessoas e projectos com valências complementares. Essas funcionalidades incluirão um portal de informação sobre competências pessoais e organizacionais, um catálogo de projectos, informação actualizada de financiamentos, um sistema de matchmaking de interesses e oportunidades, bem como um sistema de partilha de recursos humanos e outros (recursos que podem estar centralizados numa organização ou descentralizados em diversas organizações que trocam recursos entre si). 

No que diz respeito ao financiamento e criação de novas oportunidades, o gestor desta plataforma poderá ainda ter um papel interventivo na promoção de interesses comuns junto das instituições e linhas de financiamento.

A plataforma tem uma componente online, através de um site e fórum de matchmaking, e encontros físicos regulares, que podem eventualmente ser alinhados com o Encontro Nacional de Grupos Promotores da Mobilidade em Bicicleta.

A criação desta plataforma irá requerer recursos humanos tanto para o seu desenvolvimento como para a sua actividade regular. O financiamento desses recursos pode ser obtido através de contributos de organizações e pessoas que pretendem participar na plataforma, aplicando critérios relacionados com o volume da sua actividade e rendimentos. A gestão do projecto poderá ser assumida por alguma entidade existente com valência agregadora entre os beneficiários.

Para a criação do Trrriiinder, a equipa definiu o seguinte calendário de atividades: Abril: criação de grupo de trabalho; Maio: mapeamento de necessidades e funções; Junho: definição da entidade responsável e mecanismo de financiamento; Dezembro: desenho do serviço; 2023, ENGPMB: lançamento do funcionamento da plataforma.

Grupo 6 – Infraestrutura e segurança
É proposta a criação de uma «rede universal de percursos cicláveis», a executar por uma entidade responsável, da mais pequena aldeia à grande cidade, partindo do facto de que muitas localidades do país estão separadas por poucos quilómetros entre si —pelo que deveria ser possível a qualquer pessoa, de qualquer idade, ir de uma à outra localidade, a pé ou de bicicleta, caso assim o desejasse.
O maior obstáculo é quase sempre a ausência de um percurso directo, confortável e seguro. Assim, o grupo propõe que a infraestrutura para os modos activos seja vista como um «desígnio nacional», e à qual seja dada tanta importância quanto é dada às redes rodoviária e ferroviária.
“Só assim a netinha pode ir autonomamente da aldeia onde vive até à cidade onde está o seu avô, deitando abaixo os estereótipos que nos moldam há décadas.” Esta ideia foi transmitida pelo grupo através de uma performance teatral.

Grupo 7 – Mobilidade escolar
Este grupo propõe o Projecto «Envolvente Escolar Segura e Saudável», inspirado nos exemplos de cidades em Espanha, França e Reino Unido, com a criação de um Manifesto + Folheto + Site para ajudar a resolver os problemas da insegurança rodoviária, da exposição infantil à poluição do ar e ao ruído, da obesidade infantil e da falta de espaço público para caminhar e pedalar em segurança nas ruas em redor das escolas. O folheto terá como objectivo sensibilizar e educar pais e mães condutores/as; o Manifesto será para entregar nos agrupamentos escolares, nas juntas de freguesia e câmaras municipais, com medidas para mitigar os problemas identificados. Pretende-se empoderar os colectivos e associações de pais e mães, professores/as e coordenadores/as de escola que são sensíveis a estes problemas, e que podem assim usar estas ferramentas, ao mesmo tempo que criamos uma massa crítica nacional para tornar as envolventes escolares mais seguras e saudáveis para as crianças e jovens.

Grupo 8 – Comunicação externa
Identificando a necessidade de combater a iliteracia sobre a mobilidade — não só na forma como a comunicação social faz títulos e notícias sobre sinistros (acidentes), mas também entre técnicos municipais, e na forma como a população em geral fala sobre o assunto — o grupo trabalhou a ideia de se criar um glossário, dividido inicialmente em 4 grandes temas.
Este glossário será disponibilizado online, e será divulgado através da criação de vídeos curtos, simples e directos, gravados em todo o país por pessoas ligadas aos GPMUB. Esses vídeos serão divulgados em todas as redes sociais dos grupos e o projeto intitula-se «Deixar de Pregar aos Peixes», por referência ao sermão de Santo António aos Peixes.

Grupo 9 – Comunicação interna: «Urban Mobility Buddy»
O grupo pretende criar e desenvolver o conceito de “mediador de mobilidade urbana”, uma figura que ajude as pessoas, as famílias e as organizações a tomarem melhores decisões nas suas deslocações quotidianas, reduzindo a sua motorização e oferecendo alternativas mais sustentáveis (transporte colectivo, mobilidade activa, carpooling ou uma combinação de várias mobilidades). Esta pessoa mediadora irá estudar com potenciais interessados o perfil de deslocação diário e providenciar um plano alternativo que seja mais eficaz e eficiente (mais barato, rápido e motivador). Posteriormente, assumirá a função de buddy, com semelhanças ao projecto Bike Buddy, experimentará esse plano e fará a sua avaliação com o participante de modo a que ocorra uma mudança gradual no comportamento de mobilidade. Existe a expectativa de que esta função possa passar a existir nos serviços técnicos municipais, empresas de transporte, associações de mobilidade activa e grandes organizações empregadoras, sendo para isso necessário formar buddys e encontrar os meios financeiros e logísticos para que possam desenvolver a sua actividade. A ideia foi também apresentado também em modo teatral!

A apresentação dos resultados das sessões de trabalho decorreu no último dia do encontro, no Edifício Fernando Távora (Atlas), no centro de Aveiro, sendo aberta a toda a comunidade.

Para além dos GPMUB, estiveram representados o Instituto da Mobilidade e dos Transportes, a Câmara Municipal de Aveiro e a União das Freguesias de Glória e Vera-Cruz, nas pessoas dos seus presidentes e também da vereadora da mobilidade do município de Aveiro.

Da parte da MUBi, estiveram presentes no Encontro vários membros dos Órgãos Sociais da MUBi: Ana Pereira, Herculano Rebordão, Inês Pascoal, João Clemente, João Bernardino, Ricardo Ferreira, Rui Igreja e Vera Diogo, alguns também em representação de outros grupos/iniciativas de que fazem igualmente parte, como a Bicicultura e o Projecto Quimera.

De entre os diversos grupos e participantes a título individual que deram o seu contributo neste evento, vários são associados/as da MUBi, tendo estado estes dias em Aveiro a pensar e trabalhar para uma mobilidade urbana mais saudável, inclusiva, económica e ambientalmente sustentável em Portugal. 

Agradecemos à Ciclaveiro a organização desta fantástica iniciativa! Não só foi uma autêntica aventura, como destes dias de trabalho e reflexão conjunta saíram ideias incríveis para transformar e melhorar as condições para o uso da bicicleta em Portugal.

Até ao próximo ENGPMUB!

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