Governo e partidos na Assembleia da República apresentaram, em conjunto, 20 medidas favoráveis à mobilidade activa para o OE 2023. Se forem aprovadas, constituirão um passo importante e sinal positivo de vontade de mudança de paradigma nas políticas nacionais para a mobilidade urbana.

Na proposta de Orçamento do Estado para 2023 (OE 2023), o Governo incluiu apenas duas medidas para a mobilidade activa. A Proposta de Lei adjudica 1 milhão de euros para a execução das Estratégias Nacionais para a Mobilidade Activa Ciclável (ENMAC) 2020-2030 e Mobilidade Activa Pedonal (ENMAP) 2030 – o que já era manifestamente insuficiente para a ENMAC pretende-se agora que seja dividido entre as duas Estratégias. A continuação do programa do Fundo Ambiental que apoia a aquisição de bicicletas convencionais, eléctricas e de carga está indicada no relatório que acompanha a proposta do OE 2023 – sem mencionar, no entanto, o reforço orçamental que o contexto histórico obrigaria.

A MUBi considera esta proposta de OE uma desilusão. Tendo em conta a urgência de acção climática e de redução de emissões nos transportes, os esforços que são necessários para alcançarmos as metas estipuladas pelas duas estratégias nacionais para os modos activos e os investimentos de grandeza muito superior nesta área realizados e anunciados por outros países europeus, esperava-se e exige-se muito mais em matéria de política orçamental do Estado para a mobilidade activa.

A proposta de OE 2023 foi aprovada na generalidade a 27 de Outubro, após o que os partidos na Assembleia da República puderam submeter propostas de alteração, no debate na especialidade. De entre elas, a MUBi identificou 18 propostas relevantes para a mobilidade activa, que apresentamos resumidamente de seguida. Muitas destas propostas estão próximas, ou alinhadas, com várias das 6 medidas prioritárias que apresentámos para o OE 2023.

1. Dotar a ENMAC 2020-2030 de recursos para acelerar a sua implementação
2. Contratação e formação de técnicos das autarquias e organismos de Estado nas áreas da mobilidade activa e sustentável
3. Programa nacional de apoio ao desenvolvimento e implementação de Planos de Mobilidade Urbana Sustentável
4. Apoios para os municípios implementarem alterações do espaço público no sentido de aumentar a segurança e conforto dos modos activos
5. Incentivos às deslocações pendulares casa-trabalho em bicicleta
6. Taxa reduzida de IVA (6%) para velocípedes e componentes

Proposta de alteração ao OE 2023

No âmbito da ENMAC 2020-2030, o PSD defende (proposta de alteração 885C) a alocação do montante de 6 milhões de euros para investimento na concretização da ENMAC em 2023. O Livre propõe (1590C) a contratação de 20 pessoas para a estrutura de coordenação da ENMAC e da ENMAP, e (1057C) a verba de 5 milhões de euros para a execução destas Estratégias. O PAN pede (1443C) que, até ao final do 1º trimestre de 2023, o Governo liberte a verba prevista no OE 2022 para a ENMAC. Nestas propostas, o PSD e o Livre reclamam, ainda, respectivamente, que a mobilidade em bicicleta seja elegível no Programa para a Acção Climática e Sustentabilidade (PT2030) e a criação de um programa de formação e capacitação de técnicos das autarquias e outros organismos do Estado na área da mobilidade activa.

O Bloco de Esquerda propõe (714C) uma linha de financiamento de 3 milhões de euros para apoio aos municípios para melhoria ou criação de sistemas de bicicletas partilhadas. O Livre sugere (1179C) o mesmo, para sistemas municipais e intermunicipais, com uma dotação de 5 milhões de euros.

O BE defende (717C) a criação e implementação de um programa de incentivo às deslocações pendulares casa-trabalho em bicicleta. O Livre propõe (1556C) um programa de mobilidade sustentável casa-trabalho, mais amplo, que inclua incentivos à utilização da bicicleta nas deslocações para o trabalho para os trabalhadores do Estado, a que possam aderir outros empregadores. Nesta proposta, o Livre sugere, também, que o Estado incentive a criação de Planos de Mobilidade para empresas e locais da administração pública com mais de 100 trabalhadores no mesmo local.

O Livre propõe (1167C) a criação de um programa nacional de apoio à implementação de Planos de Mobilidade Urbana Sustentável (PMUS), que inclua a capacitação dos municípios e com um gestor nacional do programa. Também o PSD defende (889C) incentivos à elaboração de PMUS, estando esta proposta enquadrada no artigo 189.º da Proposta de Lei (ver parágrafo seguinte).

O artigo 189.º da proposta do Governo prevê «a criação de um mecanismo que promova a mobilidade sustentável e a coesão territorial, financiado por reafectação das reduções fiscais da receita proveniente do ISP [Imposto sobre Produtos Petrolíferos]». Para esse efeito, o Governo determinará soluções relativas a: a) renovação do parque automóvel (incentivo ao abate de viaturas mais poluentes), b) descontos em portagens nos territórios de baixa densidade e c) programas de apoio ao uso do transporte público. O Livre defende (1068C) que, para além de promover o abate de veículos automóveis poluentes e a sua substituição por veículos automóveis mais recentes e menos poluentes, este mecanismo promova igualmente a substituição da posse de um carro por alternativas de mobilidade mais eficientes e sustentáveis, como os modos ativos e os transportes públicos. O partido propõe, ainda, que o mecanismo contemple também programas de estímulo ao uso dos modos de transporte ativos, como andar a pé ou a utilização de bicicleta.

O PAN quer (40C) que o programa de apoio à aquisição de bicicletas conste do articulado do Orçamento, e propõe o reforço em 350 mil euros da verba para bicicletas convencionais, para um total de 5000 unidades de incentivo nesta tipologia (em 2022, o programa atribuiu 150 mil euros para 1500 bicicletas convencionais). Já o Livre pretende (1568C) o alargamento para pelo menos 2000 bicicletas convencionais, comparticipadas em 50% até 200 euros (o apoio tem sido só de 20% até 100 euros), 7500 bicicletas eléctricas e 1000 bicicletas de carga, e que, a partir de 2023, o programa passe a abranger também bicicletas adaptadas para pessoas com deficiência e kits de conversão para bicicletas eléctricas.

O Livre propõem (924C) que a aquisição de velocípedes passe a constar da lista de bens e serviços sujeitos à taxa reduzida de IVA (6% no Continente, e 5% e 4% na Madeira e nos Açores, respectivamente). O PAN defende (24C) que, para além da aquisição, também os serviços de aluguer de bicicletas tenham a taxa reduzida de IVA. E o PCP propõe (1505C) que as bicicletas sejam sujeitas à taxa intermédia de IVA de 13%. (Nota: Actualmente, apenas os serviços de reparação de velocípedes estão sujeitos à taxa reduzida de IVA. Na compra de uma bicicleta é aplicada a taxa máxima de 23%).

O PAN propõe (1684C), ainda, um programa de apoio aos municípios para a criação ou melhoria de 500 estacionamentos de bicicletas e de outros “veículos suaves“, especialmente junto a serviços públicos. O Livre defende (1169C) a criação de um programa que incentive os municípios a procederem a intervenções no espaço público no sentido de aumentar a segurança e conforto dos modos activos, “apoiando a criação e o aumento de zonas 30, de zonas de coexistência, de zonas de emissões reduzidas ou nulas, de medidas de acalmia e restrição de tráfego automóvel“.

Lamentavelmente, PS e Iniciativa Liberal não apresentaram qualquer proposta para o OE 2023 no âmbito da mobilidade activa.

As votações na especialidade decorrem entre 21 e 25 de Novembro, tendo nesse último dia também lugar a votação final global.

A MUBi congratula-se por uma grande parte das medidas prioritárias que  apresentou estarem em cima da mesa das discussões e negociações do Orçamento do Estado para 2023. Se forem aprovadas, constituirão um passo importante e um sinal muito positivo de que existe vontade para mudar o paradigma nas políticas à escala nacional para a mobilidade urbana.

Propostas aprovadas

Foram aprovadas as propostas 924C e 24C, do Livre e do PAN, respectivamente, que alteram o Código do IVA de forma a que a aquisição de velocípedes passa a constar da lista de bens e serviços sujeitos à taxa reduzida (6%) de IVA.
O Livre e o PAN substituíram, no entanto, as propostas que tinham submetido inicialmente. O Livre propunha a taxa reduzida de IVA também para componentes, e o PAN também para os serviços de aluguer de bicicletas. Supomos que os dois partidos não terão conseguido acordar a aprovação dessas propostas iniciais.

Foi aprovada a proposta 1556C, do Livre, “Programa de Mobilidade Sustentável Casa-Trabalho“. Contudo, também neste caso, o Livre alterou a proposta inicialmente submetida. Sendo a sua substituição, que foi aprovada, substancialmente reduzida face à versão inicial.

Foi parcialmente aprovada a proposta 40C , do PAN. O programa de incentivo à introdução no consumo de veículos de baixas emissões, que estava apenas indicado no relatório que acompanha a proposta do Governo, passará a constar do articulado do OE 2023. A parte desta proposta que pedia o reforço de verbas para a tipologia de bicicletas convencionais foi rejeitada.

Terá sido, ainda, aprovada a alocação de 1 milhão de euros em 2023 para a execução da ENMAC 2020-2030 e ENMAP 2030, conforme consta da proposta do Governo. A mesma verba que o OE 2022 destinou à ENMAC passa, assim, a ser dividida, no OE 2023, entre as duas Estratégias.

Propostas rejeitadas

Todas as restantes propostas aqui referidas foram rejeitadas.

Nota:
Actualizado em 22/11/2022, tendo sido acrescentadas as propostas 40C, do PAN, e 1568C, do Livre, sobre o programa de incentivos à aquisição de bicicletas.
Actualizado em 23/11/2022, acrescentando-se as propostas 924C, 24C e 1505C, do Livre, PAN e PCP, respectivamente, sobre a redução do IVA, e a proposta 1057C, do Livre, respeitante ao financiamento da ENMAC e da ENMAP.

Actualizado em 24/11/2022 com os resultados das votações na especialidade.

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