A MUBi é uma das já mais de cem organizações de todo o mundo que, por ocasião da Conferência do Clima COP27, pedem aos Governos e cidades que invistam mais nos modos activos de deslocação (andar a pé e utilização da bicicleta) por forma a alcançarmos as metas climáticas e melhorarmos a vida das pessoas.

Permitir que mais pessoas possam caminhar e usar a bicicleta em segurança, reduzindo a necessidade do uso do automóvel particular, é essencial para cumprirmos os objectivos do Acordo de Paris sobre Alterações Climáticas. Contudo, a mobilidade a pé e em bicicleta não têm tido prioridade nas políticas de mobilidade e transportes e na agenda de acção climática.

Em Portugal, o sector dos transportes é responsável por 28% das emissões totais de gases com efeito de estufa. Os transportes rodoviários são responsáveis por mais de 95% destas emissões, e estes números têm vindo a crescer continuamente há uma década, quando o país se comprometeu em diminuir as emissões neste sector em pelo menos 40% até 2030.

Num momento em que os preços dos combustíveis estão mais caros, o trânsito automóvel nas cidades portuguesas e o consumo de gasóleo e de gasolina são superiores ao que eram antes da pandemia. Isto demonstra que as políticas para uma mobilidade mais sustentável não têm sido suficientemente eficazes e que precisamos de outro tipo de abordagem e intervenção.

Os investimentos na expansão das redes pesadas de transportes públicos são bem-vindos, mas demorarão muitos anos a terem impacto. O Programa de Apoio à Redução Tarifária dos Transportes Públicos (PART) é uma boa medida em termos de equidade social, mas tem pouco efeito na redução da utilização do automóvel particular. Especialmente tendo em conta a actual conjectura geopolítica e económica, são necessárias medidas que consigam no curto e médio prazo reduzir a dependência do uso do carro em Portugal.

Muitos municípios continuam a oferecer mais estacionamento automóvel, e o próprio Governo, mesmo com críticas da Comissão Europeia, destinou mais de 700 milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para a construção de mais estradas. Entre reduções de impostos, subsídios e impostos que se deixaram de cobrar na área dos combustíveis fósseis rodoviários, o Estado terá gasto mais de 1300 milhões de euros nos últimos meses – mais que o orçamento anual do Fundo Ambiental.

Por outro lado, e ao contrário de muitos outros países europeus, o PRR português excluiu a mobilidade activa, que também ficou de fora do Programa para a Acção Climática e Sustentabilidade do PT2030. Na proposta de Orçamento do Estado para 2023, o Governo destinou somente 1 milhão de euros para um ano inteiro para as Estratégias Nacionais para a Mobilidade Ciclável e Mobilidade Pedonal (ENMAC 2020-2030 e ENMAP 2030), que é o mesmo que o Governo da República da Irlanda, com metade da população portuguesa, decidiu investir por dia nestes modos de transporte. A ENMAC 2020-2030, que já está no quarto ano de implementação, continua sem liderança política, sem recursos e ainda sem ter o seu plano de acção devidamente calendarizado e orçamentado. 

A transição para um paradigma de mobilidade verdadeiramente sustentável requer que uma parcela considerável do investimento em transportes seja destinada aos modos activos. Permitir que uma maior proporção das deslocações urbanas seja feita a pé ou de bicicleta é uma maneira rápida, acessível e eficiente de reduzir significativamente as emissões dos transportes, congestionamentos de trânsito e a sinistralidade rodoviária. Simultaneamente, proporcionará melhor saúde pública, economias mais fortes e sociedades mais justas.

Mais de 30% das viagens de carro nas cidades são inferiores a 3 km e 50% inferiores a 5 km. Muitas destas deslocações podem ser feitas a pé ou de bicicleta, se existirem condições de segurança e conforto para o uso destes modos. As bicicletas eléctricas expandem ainda mais este potencial, e andar a pé ou de bicicleta 30 minutos por dia é suficiente para cumprir os requisitos mínimos de actividade física recomendados pela Organização Mundial da Saúde e reduzir o risco de morte prematura em 20 a 30%.

Por todas estas razões, as organizações signatárias apelam aos governos nacionais e municipais que se comprometam a priorizar e investir na mobilidade pedonal e em bicicleta, através de Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC) e estratégias integradas e coerentes, incluindo planos, financiamento e acções concretas para:

  • Infraestruturas e alterações do espaço público – que tornem o andar a pé e a utilização da bicicleta seguros, acessíveis e fáceis.
  • Campanhas – para a fomentar a mudança de cultura e de hábitos de mobilidade.
  • Ordenamento do território – para garantir proximidade e qualidade de acessibilidades a pé e em bicicleta aos serviços quotidianos.
  • Integração com o transporte público – para suportar a mobilidade sustentável em viagens mais longas.
  • Capacitação – para permitir a implementação bem-sucedida de estratégias eficazes de mobilidade pedonal e em bicicleta e que tenham impactos mensuráveis.

A MUBi apresentou seis medidas prioritárias para o Orçamento do Estado para 2023, alinhadas com estes objectivos, que contribuirão para acelerar a transição para uma mobilidade urbana mais saudável, justa, eficiente e sustentável. A associação defende que pelo menos 10% do orçamento total para transportes seja destinado à mobilidade em bicicleta e outros 10% ao modo pedonal.

Estamos convencidos que colocar os modos activos de transporte no centro das estratégias globais, nacionais e locais para enfrentar as alterações climáticas, não só contribuirá para alcançarmos as urgentes metas climáticas como também melhorará a vida das pessoas.

Rui Igreja, dirigente da MUBi realça que «o Primeiro Ministro diz que temos de reduzir rapidamente a pressão e utilização do carro nas cidades. Mas o blá blá blá não serve. O consumo de gasóleo e gasolina, as emissões e o trânsito automóvel nas cidades portuguesas são agora maiores do que nunca, e continuam a crescer. É urgente que o Governo e os municípios diminuam drasticamente os recursos públicos que destinam ao automóvel, e orientem os investimentos para os modos mais eficientes, económicos e sustentáveis, como o andar a pé e a utilização da bicicleta.»

Nota:
A carta está disponível na seguinte ligação e pode ser subscrita por organizações sem fins lucrativos:
https://pathforwalkingcycling.com/cop27/

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