A versão preliminar do Acordo de Parceria – Portugal 2030 apresenta uma visão redutora para o sector dos transportes. A abordagem para a mudança do paradigma da mobilidade urbana carece ser mais alargada e abrangente do que simplesmente infraestruturas e tecnologia, sob pena de repetirmos o falhanço do Portugal 2020. Acessibilidades a pé e em bicicleta às estações integradas nos investimentos em transportes públicos, massificação de medidas de redução efectiva de velocidades nas cidades e apoios ao planeamento e mudança da cultura da mobilidade, são algumas das estratégias que a MUBi quer ver incluídas no Portugal 2030.

Por ocasião da consulta pública ao documento preliminar do Acordo de Parceria – Portugal 2030, a MUBi enviou o documento em anexo que aqui se resume. O Portugal 2030 tem como objectivo definir a forma como vamos utilizar os Fundos Europeus nos próximos anos (2021-2027), e será a base dos programas operacionais temáticos e regionais que serão definidos subsequentemente.

O Portugal 2020 falhou rotundamente em contribuir para reduzir o número de carros nas cidades e a ameaça que estes constituem à saúde pública e, em particular, ao uso dos modos activos de deslocação. E nesse sentido é a altura de dar muito mais atenção ao sector dos transportes nos próximos anos, em particular em relação à necessidade de investimentos na mobilidade sustentável e activa.

Portugal é caracterizado por uma forte dependência do uso do automóvel particular – é o segundo país da União Europeia com maior proporção de quilómetros-passageiro feitos de carro. As emissões do sector dos transportes em Portugal vêm a aumentar continuamente desde 2013, e este passou em 2019 a ser o sector com maior peso (28%) nas emissões do país. O transporte rodoviário é responsável por mais de 95% das emissões do sector e também a principal causa da poluição do ar nas cidades. Portugal tem também dos piores indicadores de segurança rodoviária dentro das localidades da União Europeia.

A MUBi considera que a visão apresentada para o sector dos transportes é redutora a vários níveis. A abordagem para a mudança do paradigma da mobilidade carece ser mais alargada e abrangente do que simplesmente infraestruturas e tecnologia, sob pena de repetirmos o falhanço do Portugal 2020

Apesar da MUBi saudar os investimentos em transportes públicos, preconizamos que estes devem ser acompanhados pela promoção da multimodalidade, de forma a que a mobilidade activa seja também a coesão alimentadora de um sistema de transportes públicos bem sucedido. Este sistema de transportes públicos bem sucedido requer complementaridade com os modos activos, designadamente através de áreas de captação de acesso às estações com boas acessibilidades pedonais e infraestrutura ciclável num raio de 5 a 8 km de cada estação ferroviária ou interface de transportes públicos, o que não se verifica no território português. Os esforços para melhorar os transportes públicos devem ter em consideração que as condições de acessibilidade a pé e em bicicleta às estações são tão importantes como a própria rede de transporte público.

É irrealista pensar-se que conseguiremos promover a mobilidade activa nas cidades e alcançar as metas da Estratégia Nacional para a Mobilidade Activa Ciclável 2020-2030 apenas com infraestruturas dedicadas, como o documento apresenta. É fundamental desencorajar o uso excessivo do automóvel nas cidades e baixar as velocidades motorizadas, nomeadamente através da transformação do espaço público e massificação de medidas de gestão e físicas de acalmia de tráfego.

As transformações  infraestruturais são essenciais, mas insuficientes para conduzir a uma transferência modal massiva do automóvel particular para modos mais sustentáveis. Nesse sentido, o Portugal 2030 deverá igualmente investir na mudança da cultura da mobilidade em Portugal, apoiar os municípios na elaboração e implementação de Planos de Mobilidade Urbana Sustentável (PMUS) e contribuir para a contenção da dispersão urbana e modelos urbanísticos de proximidade, como o conceito de “cidade dos 15 minutos”.

Por fim, não podemos aceitar que a mobilidade activa, depois de excluída do Plano de Recuperação e Resiliência, seja agora também excluída do Programa Operacional “Acção Climática e Sustentabilidade”, e seja unicamente apoiada ao nível dos programas regionais. Portugal tem uma estratégia nacional para a mobilidade em bicicleta, publicada há dois anos e meio, e está a desenvolver uma estratégia nacional para a mobilidade pedonal – ambas sem recursos humanos e financeiros.

O documento completo (pdf) submetido no âmbito da consulta pública e entregue ao Governo está disponível AQUI.

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