Muitas das medidas prioritárias que a MUBi apresentou para o Orçamento do Estado para 2024 (OE 2024) surgem vertidas em propostas que os partidos submeterem na discussão na especialidade, e que estarão em votação entre 23 e 29 de Novembro. Desde 2018, quando começámos a reunir regularmente com os partidos na Assembleia da República, o número de propostas favoráveis à mobilidade activa aumentou de apenas duas para 23 este ano.

A proposta que o Governo apresentou de Orçamento do Estado para 2024 (OE 2024) continha somente uma única rubrica para a mobilidade activa: 1 milhão de euros para a execução das Estratégias Nacionais para a Mobilidade Activa Ciclável (ENMAC 2020-2030) e Pedonal (ENMAP 2030) em 2024. Como a MUBi alertou, este montante é manifestamente insuficiente face às necessidades e metas destas Estratégias. Como termo de comparação, 1 milhão de euros é quanto a República da Irlanda, com metade da população portuguesa, decidiu investir por dia na mobilidade activa.

No relatório que acompanha a proposta de OE 2024, fora da Proposta de Lei e, por isso, sem carácter vinculativo, o Governo mencionou que i) daria continuidade ao programa de incentivo à aquisição de veículos de baixas emissões, que tem abrangido bicicletas eléctricas citadinas, de carga e convencionais, e que ii) um programa de incentivo ao abate de veículos automóveis em fim de vida apoiaria a troca por bicicletas de carga e o depósito em Cartão de Mobilidade (para a aquisição de serviços/passes de transporte público).

No processo de debate do OE na especialidade, os partidos com assento parlamentar puderam submeter propostas de alteração à Proposta de Lei apresentada pelo Governo. Destas, a MUBi identificou 23 propostas que directamente contribuem para ajudar a impulsionar a mobilidade em bicicleta em Portugal. Muitas destas medidas (resumidas na seguinte secção) estão próximas ou alinhadas com várias das propostas prioritárias apresentadas pela MUBi para o OE 2024.

Congratulamo-nos por desde 2018, quando começámos a reunir regularmente com os partidos na Assembleia da República, o número de propostas para os Orçamentos do Estado favoráveis à mobilidade activa ter aumentado de apenas duas, nesse ano, para 22 propostas agora para o OE 2024. Apesar de ainda muito aquém do necessário e do verificado nos restantes países europeus, é de saudar que os partidos políticos em Portugal comecem a apresentar respostas para travar e inverter o crescimento na utilização do automóvel particular, em particular nas zonas urbanas, e no consumo de combustíveis fósseis rodoviários. 

As estratégias nacionais para a mobilidade activa estipulam que o andar a pé e a utilização da bicicleta sejam os principais modos de deslocação quotidiana para perto de metade dos portugueses, até 2030, perfazendo cerca de 1500 milhões de viagens pendulares em modos activos por ano. Apenas a sete anos do prazo dessas metas, é urgente uma grande transformação e investimento por parte de todos os níveis da administração pública, incluindo, naturalmente, como principal instrumento financeiro do país, também nos Orçamentos do Estado.

Lamentavelmente, às portas de mais uma Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP28), persistem propostas para OE para a construção e ampliação de infraestruturas rodoviárias e a continuidade da redução indiscriminada de taxas e impostos sobre os combustíveis fósseis rodoviários, o que mereceu críticas incisivas da Comissão Europeia

As votações do OE na especialidade, dos artigos da proposta do Governo e das propostas de alteração apresentadas pelos partidos, decorrem entre 23 e 29 de Novembro, tendo nesse último dia também lugar a votação final global do OE 2024. Se for aprovado, seguirá para promulgação pelo Presidente da República e deverá entrar em vigor a 1 de Janeiro de 2024.

Propostas para o OE 2024

Investimento na ENMAC 2020-2030 e ENMAP 2030 e capacitação das entidades

O PAN defende (proposta 64C) o reforço em 2 milhões de euros para a concretização da ENMAC 2020-2030 e ENMAP 2030, tendo em vista a criação de um centro de competências nacional para a coordenação das políticas para a mobilidade activa, incluindo a gestão e organização destas Estratégias, e de um programa de capacitação das entidades responsáveis pela execução das suas medidas. Já o Livre propõe (proposta 1192C) a alocação de 5 milhões de euros para a execução das Estratégias em 2024, defendendo que este montante seja largamente aumentado nos anos seguintes. Por sua vez, o PSD (proposta 699C) propõe que o Governo avalie o nível de implementação da ENMAC 2020-2030 face às metas e medidas definidas, e o reforço de investimento alocado à sua concretização no montante de 6 milhões de euros.

Ainda no âmbito da ENMAC 2020-2030 e da ENMAP 2030, o Livre quer (proposta 910C) que o Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT) abra concurso para o preenchimento de 20 postos de trabalho para apoio exclusivo ao Grupo de Projecto para a Mobilidade Activa. O partido propõe, também, que o IMT desenvolva um programa de formação e capacitação de técnicos de autarquias, institutos públicos e outros organismos do Estado nas áreas da mobilidade ativa, inclusiva e sustentável e cidadania rodoviária.

Recordamos que há poucos meses, a Assembleia da República defendeu o aumento substancial de recursos humanos e financeiros para a implementação da ENMAC 2020-2030 e ENMAP 2030. Esta resolução contou com os votos favoráveis de uma expressiva maioria de mais de 90% dos deputados portugueses – do PS, PSD, PCP, BE, PAN e Livre.

Apoios aos Planos de Mobilidade Urbana Sustentável e intervenções no espaço público

O PAN (proposta 17C) e o PSD (proposta 695C) defendem a criação de um Programa Nacional de Apoio ao Planeamento de Mobilidade Urbana Sustentável, em cumprimento da Recomendação (UE) 2023/550 da Comissão Europeia, contendo medidas tais como elaboração de orientações nacionais, apoio técnico e financeiro aos municípios, recrutamento e formação de recursos humanos, capacitação de entidades, comunicação, entre outras.

O Livre propõe (proposta 920C) a criação de um programa de incentivo aos municípios para intervenções no espaço público no sentido de redução do risco rodoviário em meio urbano, através de medidas de restrição e acalmia do tráfego motorizado, e melhoria de condições para a mobilidade pedonal e em bicicleta.

Incentivos às deslocações casa-trabalho em bicicleta e Planos de Mobilidade de Empresas

O BE, o PAN e o Livre propõem a criação de um programa de incentivos às deslocações pendulares casa-trabalho em bicicleta. O BE quer (proposta 1130C) que o Governo estude e reúna dados para a criação deste mecanismo durante o primeiro semestre de 2024, e proceda à implementação do programa no segundo semestre. O PAN propõe (proposta 737C) o montante de 6 milhões de euros para o primeiro ano do programa (2024), recompensando financeiramente os beneficiários em 0,25€ por quilómetro pedalado, até ao máximo anual de 250€. Por sua vez, o Livre quer (propostas 922C), em acréscimo a este programa, que o Governo incentive a criação de Planos de Mobilidade de Empresas e Pólos junto de todas as empresas e locais da administração pública com 100 ou mais trabalhadores no mesmo local.

Reforço e alargamento dos incentivos à aquisição de bicicletas

O Livre (proposta 1614C) e o  PAN (proposta 549C) querem que o programa de incentivo à aquisição de veículos de baixas emissões, apenas mencionada no relatório do OE, conste do articulado do Orçamento. No que se refere à bicicleta, ambos os partidos propõem que o programa passe a abranger velocípedes adaptados para pessoas com necessidades especiais, kits de conversão para bicicletas eléctricas, bicicletas em segunda mão e serviços de reparação de bicicletas. O Livre defende, também, que o valor do incentivo seja atribuído no momento da compra da bicicletas e que a comparticipação para bicicletas convencionais suba, dos actuais 20% até 100 euros, para 50% até ao máximo de 250 euros. O Livre pretende, ainda, que a dotação total do programa seja reforçada para 90 milhões de euros em 2024.

Sistemas de bicicletas partilhadas

O PAN (proposta 548C), o Livre (919C) e o BE (1129C) propõem a criação de um mecanismo de apoio financeiro dirigido aos municípios, ou a nível intermunicipal, para a implementação, expansão ou melhoria de sistemas de bicicletas partilhadas. PAN e Livre propõem uma dotação orçamental de 5 milhões de euros, enquanto que o BE propõe 3 milhões de euros para este propósito.

Por sua vez, o PAN pretende (proposta 15C), também, a inclusão dos sistemas de bicicletas partilhadas no âmbito dos passes intermodais gratuitos (sub-23 e 4_18, previstos no OE) e dos direitos à utilização gratuita de transportes públicos

Parqueamentos e infraestruturas para bicicleta

O BE defende (proposta 1128C) que o OE 2024 destine 750 mil euros para a instalação parques para estacionamento de bicicletas junto a estações e paragens de transportes públicos. O PAN (proposta 121C) quer apoios, dirigido aos municípios, para a criação ou melhoria de 500 parqueamentos para bicicletas, privilegiando as zonas de interface de transportes colectivos.

O PAN defende (proposta 60C) que o programa Portugal Ciclável 2030 seja reativado em 2024, e enquadrado na ENMAC 2020-2030. Este programa, que previa um investimento de 300 milhões de euros para a construção de mil quilómetros de ciclovias interurbanas até 2030, ficou parado em 2020, com apenas 2,4% do montante disponibilizado ao longo de cinco anos.

Incentivos fiscais

Com a entrada em vigor do OE 2023, a 1 de janeiro, o IVA na compra de bicicletas em Portugal baixou de 23% para a taxa reduzida de 6%. O Livre (proposta 1009C) e o PAN (113C) querem agora que a taxa reduzida seja aplicada também aos componentes e acessórios de bicicleta. Na nota justificativa desta proposta, o Livre apresenta casos de jurisprudência em como a taxa reduzida já deveria estar a ser aplicada à compra de componentes e acessórios de velocípedes. O PAN propõe que a taxa reduzida incida, também, sob os serviços de aluguer de bicicletas.

Tal como os assentos para o transporte de crianças em veículos automóveis são sujeitos à taxa reduzida de IVA, o PAN defende (proposta 114C) que a taxa de 6% seja igualmente aplicado aos assentos para transporte de crianças em bicicleta, em vez dos actuais 23%.

O PAN propõe (proposta 6C), também, que os gastos das empresas com aquisição de velocípedes para os trabalhadores e com instalação ou melhoria de estacionamentos para bicicletas sejam dedutíveis em 150% em sede de IRC.

Lamentavelmente, PS, Iniciativa Liberal e PCP não apresentaram qualquer proposta para o OE 2024 no âmbito da mobilidade activa


Actualizações com os resultados das votações:

Foram aprovadas as propostas 695C, do PSD, 920C, do Livre, e 15C, 60C e 114C, do PAN. Todas as restantes foram rejeitadas.

Notas:
Actualizado em 26/11/2023, tendo sido acrescentada a proposta 695C, do PSD.

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